sábado, 2 de junho de 2012

A TERRA INÓSPITA E O SACRAMENTO DO MOMENTO PRESENTE (PARTE 2)

De forma maravilhosamente dolorida, percebi, após experimentar incontáveis períodos de terra inóspita, que `já era tempo de eu saber que o crescimento, qualquer crescimento – mas sobretudo, o crescimento do caráter, do espírito da igreja, do corpo de Cristo, da alma – passava por períodos de letargia`. E que esse era o único caminho para evitar a perpetuação de ´uma espécie de adolescência subcristã´. E que já era tempo de eu deixar de meninice e compreender que:

Ninguém amadurece na vida cristã sentando-se em uma sala de aula, numa biblioteca, ouvindo palestras e lendo livros, tampouco indo à igreja, cantando hinos e ouvindo sermões. Crescemos quando pegamos as coisas do cotidiano, nossos pais e filhos, cônjuges e amigos, nosso local de trabalho, e nossos colegas de trabalho, nossos sonhos e fantasias, as coisas a que somos apegados, que nos proporcionam fácil gratificação, a despersonalização a que submetemos nossos relacionamentos íntimos, a retificação de verdades da vida e sua transformação em idolatrias: crescemos quando pegamos tudo isso e colocamos no altar do fogo purificador – nosso Deus é fogo consumidor – que a tudo redime santificando nossa vida. Uma vida que não está reservada somente a freiras e monges, que pode ser vivida por qualquer um, em qualquer igreja.´ (grifos meus)

Percebi que sem abraçar os períodos de letargia nunca iria aprender que ´não existe maturidade cristã sem intimidade, sem renúncia e aprofundamento pessoal.´  Porém, de repente, Peterson disse algo que me encheu de esperança:

Foi em terras inóspitas que todas as partes da minha identidade se conectaram e se fundiram de forma coordenada. ... O que durante boa parte do tempo me pareceu ser um dia nublado e de chuva fina começou a se abrir com frestas de sol e de luz de estrelas: vislumbres de uma terra exaurida.

Assim como uma sinfonia é formada de várias partes ou movimentos, conforme sua velocidade, a vida cristã também possui seu movimento mais lento ou largo – o período de terras áridas ou inóspitas - mas, graças a Deus, ele não dura para sempre, pois ele sabe que sucumbiríamos. Como diz uma antiga canção negro spiritual entoada por escravos nas lavouras de algodão do sul dos Estados Unidos:

Fique firme na tempestade, ela não vai durar para sempre. Vamos ancorar a qualquer momento. O Rei Jesus é meu Capitão. Vamos ancorar a qualquer momento.

Depois de cumprir seu papel, o período de terra árida dá lugar a um belo minueto, a música mais simples da sinfonia que repete temas iniciais e que é, inesperadamente, interrompida por temas diferentes, mas com característica semelhantes aos dos primeiros movimentos, mas bem mais triunfantes.

Ao mesmo tempo em que Deus usava as palavras de Eugene Peterson para acalmar e direcionar meu coração, alguns trechos de Isaías testificaram sobre isso e encerraram meu retiro espiritual com um cântico mais allegro e, por que não dizer, prestíssimo.

Esta é a Mensagem do Eterno, do Deus que fez você, Jacó, daquele que o formou no início, Israel: ´Não tenham medo, eu os redimi. Eu os chamei pelo nome. Vocês são meus. Quando estiverem atravessando águas profundas, vocês não se afogarão. Quando estiverem entre a cruz e a espada, não será um beco sem saída – Porque eu sou o Eterno, o seu Deus pessoal.`

Diz o Eterno, o Deus que constrói uma estrada através do oceano, que inaugura um caminho através das ondas furiosas ... Esqueçam o que aconteceu, não fiquem lembrando velhas histórias. Fiquem atentos. Não se distraiam. Vou fazer coisa diferente. E está para acontecer, não estão percebendo? Estou abrindo uma estrada através do deserto, fazendo correr rios em terras devastadas. ... Porque providenciei água no deserto, rios através da terra ressecada. (grifos meus)
(Isaías 43.1-3; 16-21 – em linguagem contemporânea de A Mensagem de Eugene Peterson)

Depois desta leitura, percebi que podia abraçar minha terra inóspita por quanto tempo ele quisesse e achar minha identidade nesta terra exaurida. Meu Deus é o Senhor das terras inóspitas. Somos dele, ele nos formou e nos chamou pelo nome, e onde quer que estejamos é solo santo para acharmos força e graça para atravessar nossos períodos de letargia e descobrir que ele abre estrada através do deserto, e faz correr rios em terras devastadas. Ele inaugura caminho novo através de ondas furiosas.

E, de forma surpreendente, olhei para mim mesma e percebi que partes de minha identidade também estavam se conectando e se fundindo de forma coordenada. Mas outra experiência contribui muito para que isso acontecesse: o sacramento do momento presente.

continua...

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